Para o Brasil, as provas de águas abertas do Mundial de Budapeste foram inesquecíveis.
Mas, é preciso que se diga, em boa parte ao desempenho de Ana Marcela Cunha.
Não se pode dizer que o retrospecto de um ouro e dois bronzes conquistados no lago Balaton é surpreendente. Afinal, estamos falando de uma nadadora que também conquistara três medalhas no Mundial passado, em 2015, e que já foi escolhida a melhor nadadora do mundo pela FINA por três vezes.
Mas claro que a trajetória da nadadora neste Mundial fica mais saborosa depois do último ano atribulado, com uma frustração olímpica e uma cirurgia para retirada do baço para controle de uma doença autoimune. Que atleta não ficaria receoso? Será que voltaria ao mesmo rendimento? Que seria a mesma Ana Marcela de sempre? Tudo isso lhe passou pela cabeça.
O terceiro título conquistado nos 25 km, hoje, foi a resposta para todas as perguntas. Dizendo-se mais preparada para provas mais curtas, especificamente os 5 km, conseguiu superar a campeã olímpica Sharon van Rouwendaal no final da prova mais longa do programa. Imaginem se estivesse bem preparada!
Na mesma prova, Betina Lorscheitter terminou na 19º posição. No masculino, Allan do Carmo chegou em 13º e Victor Colonese em 22º. Allan não chegou perto de repetir o 5º lugar de 2013, que se mantém até hoje como melhor posição da história do país em provas masculinas de águas abertas na competição.
O 5º lugar de Allan de 2013 foi igualado por Fernando Ponte nos 5 km em 2017, no primeiro dia de disputas. O 12º lugar de Viviane Jungblut nos 10 km, prova mais concorrida do programa, também é digno de menção.
Com a ausência de Poliana Okimoto, Ana Marcela foi o carro chefe solitário na briga por medalhas. Viviane e Fernando, que disputaram seu primeiro Mundial, podem evoluir e almejar por mais nas próximas edições.
No entanto, será que o Brasil seguraria a peteca em um hipotético Mundial sem Ana Marcela nem Poliana? Desde 2009 o país não sai do pódio do evento em provas de águas abertas, mas sempre com as duas nadadoras.
No programa de alto rendimento da França, país destaque dessa edição com quatro ouros em sete provas, o planejamento é que, para brigar por medalhas nos 10 km, os nadadores devem fazer tempos em torno de 16min15s no feminino e 15min00s no masculino na prova de 1500m livre em piscina longa. Aurelie Muller tem 16min24s e Marc-Antoine Olivier, 15min05s. E foram possivelmente os dois melhores nadadores da competição.
(outros exemplos são os holandeses campeões olímpicos dos 10km Sharon van Rouweendal e Ferry Weertman. A primera tem 16min03s e o segundo, 15min09s.)
A França iniciou um programa de desenvolvimento de águas abertas em 2013 que deu resultados em 2016 e continua a dar. Quem sabe o Brasil possa se inspirar no país mais vencedor desse Mundial nas águas abertas.
Os números de Ana Marcela
As três vitórias nos 25 km (2011, 2015 e 2017) representam um feito incrível, que falam por si só. Têm ainda relevância maior quando percebemos que Ana Marcela é a única atleta a vencer a mesma prova feminina de águas abertas por três vezes na história dos Mundiais de Esportes Aquáticos.
Curiosamente, o Brasil também tem o homem que mais venceu a distância mais curta em Mundiais na natação: Cesar Cielo, tricampeão nos 50m livre entre 2009 e 2013.
É a terceira vez consecutiva que o Brasil sai das águas abertas no Mundial com três medalhas (em 2013, Poliana alcançou o feito; em 2015, Ana Marcela).
E Ana Marcela entra no seleto rol de atletas brasileiros que se sagraram três vezes campeões mundiais em suas modalidades. São eles (contabilizados apenas o principal Mundial de cada esporte, e apenas esportes olímpicos):
Pelé (futebol) – 1958, 1962 e 1970
Torben Grael (vela) – classe Snipe em 1978, 1983 e 1987
Robert Scheidt (vela) – classe Laser em 1995, 1996, 1997, 2000, 2001, 2002, 2004 e 2005; classe Star em 2007, 2011 e 2012.
Emanuel (vôlei de praia) – 1999, 2003 e 2011
Giba, Rodrigão e Dante (vôlei) – 2002, 2006 e 2010
Cesar Cielo (natação) – 50m livre em 2009, 2011 e 2013
Ana Marcela Cunha (águas abertas) – 25km em 2011, 2015 e 2017
Está fraca essa lista?
Por Daniel Takata