Um dia memorável para a natação brasileira. Segundo dia de disputas no Pan de Toronto com três ouros e três bronzes, quatro recordes sul-americanos e uma marca história obtida por Thiago Pereira. E, sobretudo, com provas muito bem nadadas, sem afobação e com maturidade. Qual teria sido o maior destaque?
Poderíamos destacar Manuella Lyrio, que depois de dois Jogos Pan-Americanos como coadjuvante e medalhas apenas em revezamento, finalmente assume o papel de protagonista.
De volta ao Pinheiros, com seu técnico André Amendoim priorizou força e velocidade em detrimento dos 400m livre, e de 1min59s52, tempo no qual havia estacionado nos 200m livre de 2013 ao início desse ano, abaixou para 1min58s74 em abril e agora para 1min58s03 para um comemorado bronze.
Seu tempo é o 30º do mundo – pode não parecer muito, mas o recorde sul-americano de Mariana Brochado de 2003 foi o 45º no ranking mundial e o de Monique Ferreira de 2009 não entrou entre os 100 do mundo. Grandes perspectivas para até um sub-8min no revezamento 4x200m.
Podemos falar de Thiago Pereira, que com duas medalhas se torna isolado o maior medalhista brasileiro da história da competição, com 21, e a apenas uma do recorde histórico do ginasta cubano Eric Lopez.
Atestando o alto nível dessa competição, nos 200m peito fez um tempo mais de um segundo mais rápido que nos Pans de 2007 e 2011 (2min11s93) e que lhe dariam a vitória nas duas ocasiões, mas hoje foi suficiente para o bronze.
Ao lado de Luiz Altamir, João de Lucca e Nicolas Oliveira, Thiago venceu o 4x200m livre com recorde sul-americano e de competição de 7min11s15, somente a segunda vez que os Estados Unidos, que chegaram em segundo mas foram desclassificados, não vencem a prova – a primeira em 2007, com Thiago e Nicolas na equipe. Destaque para Luiz Altamir, abrindo para 1min48s39, melhorando quase um segundo sua marca. Muita personalidade ao lado de três companheiros olímpicos.
Podemos destacar Thiago Simon, versátil e um dos grandes destaques das últimas grandes competições nacionais. Em âmbito internacional, deu um salto hoje com o ouro nos 200m peito.
Tomando muita iniciativa desde o início, sua passagem na primeira metade foi um impressionante 1min01s73, apenas sete centésimos acima de seu melhor tempo na prova de 100m peito. Ao final, dizimou o recorde, superando-o por quase dois segundos com 2min09s82.
Sem trajes tecnológicos, seu tempo só perde no Brasil para o 2min09s77 de Tales Cerdeira. O tempo de Tales foi obtido na semifinal olímpica de 2012, um vôo alto que Simon deseja alçar e o resultado de hoje lhe dá confiança e motivação para tal.
Podemos exaltar Joanna Maranhão, que ano após ano não se cansa de mostrar sua versatilidade. Após o recorde sul-americano nos 200m borboleta ontem, outro recorde hoje nos 200m costas, com 2min12s03. Nem deu para ficar frustrada por ter ficado meio segundo do bronze ou por não ter feito 2min11s, afinal é uma melhora de quase um segundo e meio no seu tempo e a primeira vez que é a recordista continental na prova
Já é uma das melhores competições de sua vida, e uma Joanna nadando bem e motivada deixa uma grande expectativa para algo especial amanhã nos 400m medley. Depois de 11 anos, será que finalmente sai o sub-4min40s?
Também podemos mencionar Leonardo de Deus, que com o bronze nos 200m costas mostrou grande capacidade de recuperação e final de prova, após ficar fora dos três primeiros colocados durante quase toda a prova. Com sua vitória de ontem nos 200m borboleta e as medalhas de 2011, se conquistar mais uma nos 400m livre, entra para um seleto grupo de nadadores brasileiros com cinco ou mais medalhas na competição, todos entres os maiores do país.
Todos foram grandes destaques do dia. Mas o maior deles se chama João de Lucca. Por vários motivos: por trazer o Brasil ao pódio novamente nos 200m livre, por entrar entre os 10 do mundo no ano. Mas, principalmente, por representar um salto de qualidade e maturidade.
Há tempos, João é cobrado por não render em piscina de 50 metros o mesmo que rende nas competições universitárias em piscinas de jardas dos Estados Unidos, onde representa a Universidade de Louisville. É só comparar: nas 200 jardas seu melhor tempo é 1min31s51. O de Gustavo Borges, que também foi campeão universitário por lá, era 1min34s31. Esses quase três segundos de diferença não eram trazidos para piscina de 50 metros na qual João e Gustavo tinham tempos similares (1min47s98 e 1min48s08). Até hoje.
Com 1min46s42, faz o Brasil voltar ao pódio depois de 16 anos, após as três medalhas seguidas de Gustavo entre 1991 e 1999 (e o bronze de Leonardo Costa nesta última). Medalha de ouro e 9º tempo do mundo – desde 1996, com Gustavo, que um brasileiro não se colocava entre os 10 melhores do mundo na prova.
A exemplo de Manuella, não se afobou com os adversários à frente, incluindo Nicolas Oliveira e o veloz argentino Federico Gabrich, vencedor dos 100m. Mesmo tendo assumido a liderança nos 150m, poucos imaginavam um recorde sul-americano, pois sua parcial era de 1min19s48 e a de Thiago Pereira na ocasião do recorde em 2009 era de 1min18s95. No entanto, a última parcial de 26s94 lhe garantiu o recorde com 1min46s42. Para se ter uma ideia, na final olímpica de 2012, apenas o campeão olímpico Yannick Agnel fechou melhor que João.
Já são cinco ouros, mesmo número do Canadá. Há perspectiva de mais marcas históricas, como o primeiro ouro feminino brasileiro da história e a liderança do quadro de medalhas. Muito mais está por vir.
Por Daniel Takata